domingo, janeiro 15, 2006

Viagem

Outrora, coloquei, neste espaço, um poema sublime de Miguel Torga. Hoje, coloco-o, aqui, novamente...
Talvez sejam os desencontros amorosos ou a conjuntura politica em que sobrevivemos que não incitam a coragem ou que não apelam à confiança para partir numa nova viagem ou numa nova aventura...
O Mundo é cada vez mais egocêntrico... A sociedade preocupa-se mais com o dinheiro que paga as prestações do crédito hipotecário, o empréstimo do automóvel, os impostos, a gasolina ou o gasóleo, a moda... No entanto, não existe quantia numerária que sirva para pagar ou emprestar o Amor de alguém...
A Filantropia perece nas ruas ou nas avenidas dos grandes centros urbanos, onde a felicidade se esconjura. Perguntaria uma amiga: “ de que cruzar de ruas fugimos?”
A Poesia morre nos versos escritos na candura do tempo vivido pelo poeta louco e rebelde por ser original... Já ninguém quer saber das palavras vivas que estão mortas e enterradas...
A Música já não encanta nem o Sol canta na doce manhã... Já ninguém entende a hipocondria das semibreves e a alegria das colcheias...
Contudo, ninguém é idóneo de matar a minha felicidade. Ninguém me faz desistir por ser fraqueza. Afinal, quem se encontra do meu lado? Quem quer pelejar por um Mundo melhor? Benvindo, amigo, se não quiseres sobreviver e optares por viver na loucura... Benvinda, Princesa, se quiseres partir na aventura...


Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
O mar...
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos).

Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura...
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.

Miguel Torga - 1962

1 comentário:

sombra_arredia disse...

Ainda há quem sonhe no sopro de um poema,de uma melodia, de um traço a carvão feito desenho...Acredita*