terça-feira, setembro 28, 2004

Arlequim - O Anjo do Mar

Mergulho na noite e vislumbro as imagens veladas no sonho. Usurpo ingenuamente as palavras que repousam nos dicionários e escrevo-as num pedaço de papel, onde solto a fantasia emaranhada em mim. E tudo se sobressai do sonho... Nasci do amor de uma das imensas praias do Mundo... Sou filho da Areia e do Mar... Talvez seja uma canção escrita num momento no tempo...


Navegou os sete mares
E naufragou no teu olhar.
Perdeu-se na ilha dos amores
E ofereceste-lhe asas para voar.

Rastejaste-lhe até ao fim
Com o teu sorriso peculiar,
Riste do Arlequim
Que sorria ao sonhar.

E com as asas douradas,
Devolveste-lhe o respirar.
E quando voa, sobrevoa
No brilho do teu olhar.
E com as asas douradas,
Devolveste-lhe o respirar.
E quando voa, sobrevoa...
É o teu anjo do mar.

A magia da cor
Que faz os seus olhos relampejar,
Purificou a dor,
Prontificando-lhe o mar.

E com o rosto moldado,
Regressando sempre ao mesmo cais,
Parte para todo o lado
E amaina todos os vendavais.


Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores

sábado, setembro 25, 2004

Casa da Música

Ao visitar o web site do Pedro Abrunhosa, constatei que o compositor foi desconvidado para a inauguração da Casa da Música pela administração da mesma. Segundo consta no "Público", foi pelas declarações proferidas anteriormente pelo músico contra o actual presidente da Câmara Municipal do Porto... Afinal, retornámos à repressão exercida pelos regimes fascistas de António Oliveira Salazar e de Marcelo Caetano? De facto, existem pessoas retrógradas e acéfalas - autênticos lacraus fúteis da sociedade - que deviam ser urgentemente exonerados do lugar que ocupam. Isto é a evidência de que existe um autêntico absentismo de dignidade e respeito pelo português democrata - aquele que elege por sufrágio nacional. Eis o estado em que sobrevivemos... Sinceramente, não me recordo de ter elegido o actual primeiro-ministro. Alguém se recorda? Assim, talvez o presidente da República reconheça que fomos de mal a pior... " Ai, Portugal, por onde me levas... "

quinta-feira, setembro 23, 2004

Um Arauto de Éden

"Hoje, sou dono do Céu sem o querer ultrajar..." No meu leito alado e implume, viajo por paisagens quiméricas, idealizando momentos perenes. Sou um arauto de Éden, que sobrevoa a avenida, escutando a voz pungente que soa e se propaga na noite. Indago o lugar onde a voz urge, vasculhando cada lacuna da cidade, na qual se vela uma sublime palavra...um belo sentimento... Vislumbro o fulgor produzido pelo reflexo de uma lágrima dissipada num singelo parapeito de um postigo, onde surge o esgar taciturno de uma princesa desesperada.
" Luz, sai da frincha, é manhã, sei que o dia já desarvora..." E os sonhos não têm fim como as histórias que invento...


De tanto sobrevoar,
Indaguei uma lacuna no Mundo,
Em cada espaço, uma candeia acesa...
Em cada toada, um grito profundo...
Encontrei um postigo aberto
E pousei no seu parapeito,
Soltei um sopro nevado,
Logo, surgiu o teu esgar desfeito.
Porque planges na madrugada?
Porque deturpas a alvorada ?

Sou um arauto de Éden
Que, no teu quarto, veio repousar.
E desvendo o teu horizonte
No esplendor do teu olhar.
Escuta a doce melopeia,
Que sibila dentro de ti,
Torna perene o momento
E a missiva que deixo aqui...


Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores

segunda-feira, setembro 20, 2004

Menina de Olhar o Mar

"Mais uma noite a vencer..." Revejo-me nos mais sublimes momentos que passei no tempo que já vivi. Surgiu dos sonhos uma menina que se perdia a observar o Mar, escutando as palavras que o Zéfiro da maresia soltava. Menina de Olhar o Mar,os sonhos não têm fim...


Menina de Olhar o Mar,
Que escutas no zéfiro da maresia
As plácidas palavras que te conduzem
Ao culminar da porfia.
Entrega-te ao vento
Como um veleiro no alto mar,
Que desliza em perpétuo movimento
Até um dia se ancorar.

Menina de Olhar o Mar,
Desfruta o viço da maresia
E voa com asas implumes
Para os confins da Fantasia.


Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores

sábado, setembro 18, 2004

Fecha-se a mão ao adormecer

"Loucas são as noites que passo sem dormir..." Invento histórias infinitas que revelam a poesia e a música que vivem endogenamente em mim. Talvez sejam as palavras e as figuras ritmicas e melódicas veladas numa boca cerrada que descrevem os momentos efémeros, mas paradoxalmente invertidos em forma de Eternidade. No fundo, a poesia reencontra-se com a música, quando as suas mãos se fecham uma na outra e transformam a evanescência do momento na eternidade do tempo. Enfim, uma canção nasce como tudo o que existe, quando o momento de amor for perene no tempo...


Hoje, sou dono do céu
Sem o querer ultrajar.
Voo como um pássaro na contraluz,
Insistindo em te procurar...

Imagino os teus gestos
Sitos nas partituras em que os descrevo,
Indagando no canto da noite
O silêncio incólume que aqui escrevo...

Rejuvenesce-me o sorriso
Embalado pelo anoitecer.
Abre-se o horizonte!
Fecha-se a mão ao adormecer.
Foram dois anjos que se cruzaram
Num momento omnipotente,
Onde se desfez a solidão
Num beijo ardente.


Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores

terça-feira, setembro 14, 2004

Paixão - Um Momento Que Amanhece

Por vezes, recordo-me dos belos instantes que vivi... aqueles momentos em que fechamos os olhos ao medo e deixamo-nos levar pela loucura do âmago... Talvez sejam momentos pruriginosos que intimidam dois pombos paradisíacos ou os simples instantes que, num beijo, saciam as almas... Decerto que serão momentos que amanhecem numa palavra por dizer...


Dois olhares que se cruzam;
Dois sorrisos que despertam;
Dois corações que se intimidam;
Duas almas que se apertam;
Duas bocas no silêncio ancoradas;
Duas almas que vacilam sem razão;
Duas metades de Lua emaranhadas;
Dois anjos cintilantes na escuridão;

Duas mãos totalmente vazias;
Duas almas cobertas por um véu;
Duas vozes que cantam todos os dias;
Dois pombos paradisíacos, donos do Céu;
Dois corações que sibilam no escuro;
Duas almas vivas na pobreza do Mundo;
Dois corações que anseiam o mesmo futuro;
Duas almas que se saciam num beijo profundo;

Um momento que amanhece
Numa palavra por dizer...
Um regaço que nos aquece
Um coração a tremer...

Uma mão estendida
De um vagabundo à espera
De um beijo ao adormecer
De uma dama da Primavera...


Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores

sábado, setembro 11, 2004

Manta de Retalhos

Foram dois dias intensos que vivi e que se laconizam num só momento. Nos camarins do auditório da Biblioteca Municipal Orlando Ribeiro, anseava o instante que, num dia, o sonho idealizou. O palco estava integralmente ornamentado com instrumentos musicais, o que transparecia a magia da Arte. Finalmente, apagaram-se as luzes do auditório e surgi em cena... Eis a hora derradeira... Os sons de cada instrumento conjugavam-se na atmosfera do recinto... As vozes ecoavam no espaço... As palmas confortavam-me... Dissipou-se a magia... Foram instantes irrepetíveis que vivi loucamente...
Vangloriaram-me com elogios no fim do derradeiro espectáculo que, docemente, me confortaram... Como é bom sentir o reconhecimento do público... No entanto, a esfinge do momento permanece no palco, onde tudo tornou-se real e somente os protagonistas sabem desvendá-la...
Por fim, ofereço estas breves palavras a quem soube partilhar comigo o sonho... o palco... o momento.

quinta-feira, setembro 09, 2004

A Música - O Lugar da Quimera

Nas imensas noites em que exorcizo o passado atroz, sobrevoo paisagens infinitas num leito alado e implume. Talvez sejam paisagens escondidas na Quimera, onde desvendei um espaço sublime, cujo o seu pecúlio pertence a quem teve a ousadia de sonhar um dia. Assim, perco-me integralmente num lugar, onde tudo o que é tangível e intangível se eterniza nos dedos de um pianista. Eis o lugar da Quimera, onde se imiscui figuras ritmicas e melódicas com grifos oriundos dos âmagos de todos os seres estrógenos que se velam no Mundo...


A Música é o sonho que me prende ao leito,
O lugar onde se vê a quimera nascer;
É o silêncio que escuto quando me deito
E que me embala até adormecer...

É o Mundo, a Lua, é toda a atmosfera...
É todo o lugar por onde caminho e não me canso;
É Verão, Outono, Inverno e Primavera,
O único momento em que descanso...

A Música é uma espécie de Céu,
Que se esconde nas mãos de uma criança;
É a alma que se envolve num véu
Repleto de melodias de bonança...

A Música é o meu beijo mais profundo
Vindo do fundo, só para te agarrar;
É a força e a armadura do Mundo;
É o meu corpo, a minha vida, que sei abraçar...

A Música é a poesia que sobrevoa no ar
De todo o lugar onde me quero esconder;
É a palavra que leio no teu olhar
E o som do dia ao amanhecer.


Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores

segunda-feira, setembro 06, 2004

A Arte - O Sémen do Amor Mundano

Nas noites em que esconjuro a solidão, invento histórias sem fim. Talvez seja a Arte que me faz sobrevoar paisagens infinitas, onde busco a magia que utilizo para enfrentar os medos e os cansaços que infelizmente a vida nos dá. Revelei num dos temas anteriores que a Arte é um subterfúgio que encontrei para me abstrair da futilidade do Mundo. Tudo aquilo que não é idóneo de se banalizar, é a forma mais etérea de descrever o pensamento, de evidenciá-lo e de manifestá-lo de um modo congruente. No entanto, poderíamos definir a Arte como o retrato abstracto da sociedade velada na intransigência do Mundo ou como um beijo perene que se oferece a quem nos concede um regaço ou como um grito filantropo de quem pretende salvar o Universo ou de quem vive com essa ilusão...

A Arte é a palavra que respira num dicionário,
Que se esmera num livro de poesia;
É a sílaba pronunciada no silêncio plenário
Que a natureza demonstra por magia...

É o gemido de um piano sonâmbulo
Que persegue na noite o sonhador;
É uma sóbria aresta de um triângulo
Que a Trigonometria desvenda sem pudor...

A Arte é uma lágrima no oceano
Dissipada por um anjo enfadonho;
É o sémen do amor mundano
Plantado nas planícies do sonho...

A Arte é a palavra transfigurada numa rosa,
Que transcende os feitiços do anoitecer;
É a casta beleza da poesia narrada em prosa,
Que interpela o sonhador ao amanhecer...


Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores

domingo, setembro 05, 2004

A Vida - A Arte Perene

Há dias que gosto de me debruçar sobre a vida. Tento preencher cada lacuna do tempo com um pensamento. Descobri que tudo deve ser vivido com Arte, de modo a que nenhum momento se desvaneça com o tempo. Na canção que deixo aqui, retrato a resistência de um povo oprimido por um Estado de censura, que saiu à rua num dia de revolução em Portugal. A forma como a "revolução dos cravos" foi arquitectada e desenrolada por um movimento constituido por militares das forças armadas é a evidência de que tudo deve ser criado com estro. Foram vozes endógenas que surgiram no interior das mentes estrógenas dos criadores da revolução, que fizeram com que esse dia...esse momento fosse jamais esquecido pelo vulgo português. Viva o 25 de Abril! Viva a Liberdade! Benditos sejam aqueles que libertaram o sonho de Portugal e eternizaram a Arte oculta num momento que nunca vivi...

A Vida é a arte que se espelha
No nosso planeta em movimento;
É a voz que se esmera
Nas teias de um amor sedento...
A Vida é o apelo escrito no mural
Pelo povo oculto na ausência de expressão;
É o manifesto do vulgo que craveja
Nas ruas em que se desenrola a revolução...
A Vida é a resistência de quem padece
Debaixo da intempérie da guerra,
De quem se imuniza no sonho indelével
Mesmo quando o dia encerra...

Canção registada na Sociedade Portuguesa de Autores.

sexta-feira, setembro 03, 2004

O Eufemismo da Memória

Há uns tempos atrás, descobri o estro escondido em mim. Comecei a dedicar-me à Arte, compondo canções relacionadas com o quotidiano ou com situações subjectivas. Além de ser um refúgio, a Arte é o subterfúgio que desvendei e utilizo para me abstrair dos maus vícios da sociedade. Assiste-se todos os dias nos noticiários a mais uma conjuntura política. É tão grande a coincidência dos factos, que só mesmo um eufemismo poderá suavizar o que ocorre na política portuguesa, que cada vez mais se distingue da filosofia. Acredito que os pensamentos de Sócrates ( filósofo grego )redigidos por Platão na sua obra literária, Górgias, são cada vez mais actuais. A política assemelha-se à retórica ou à submissão excessiva da actuação dos seus responsáveis ao agrado do vulgo, que já não é quem mais ordena. E mesmo as baladas do meu querido Zeca Afonso, que mimeticamente utilizo como fonte de inspiração para compôr as minhas espécies de canção, estão também mais actuais... "Eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada..."
Bem... são tantas os factos pejorativos da nossa sociedade, que materializam a história do nosso país. Dessa forma, escrevi uma canção, que exprime o meu descontentamento pela forma como é conduzida a política de Portugal:


Sei que desdenho o que é inútil
E a sabedoria de um lacrau fútil,
Que esbanja demagogia
Nos dias de romaria...
Sei que desdenho o lugar
Onde se perde tempo a escutar
As verborreias tão exíguas
Ditas por mentes não ambíguas...

Sei que desdenho o consumismo
Que corrobora o materialismo
E toda a instância do Poder
Que transfigura o ser...

Isto é só o materialismo da história,
O eufemismo da memória...

Ai, Portugal, por onde me levas?